quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Do Camarote Tricolor

Teatini recolheu esta da lista do Camarote Tricolor; o autor é desconhecido, mas inspirado. Compartilho a fábula com vocês:


"- Loucos, loucos, isso é o que vocês são, um bando de loucos!
O brado rouco e grave era inconfundível: Nelson Rodrigues estava de volta. Deixara seu repouso celestial para dar um sonoro puxão de orelhas em sua torcida.

Estava no Salão Nobre das Laranjeiras o Profeta Tricolor. O Baile de Gala mal havia começado e a casa já estava cheia.Gente bonita, bem vestida, muitos sorrisos e comilanças. Na festa dos 107 anos de fundação do Fluminense, a ordem era esquecer o péssimo momento em campo e comemorar.

Mas a celebração em meio ao caos pareceu ter mexido com os brios de Nelson: jornal com a última derrota em mãos, tratou de abri-lo e estendê-lo, para que todos lessem a nada agradável manchete estampada em letras garrafais.

- Olhem aqui, olhem aqui: o Fluminense na última colocação. Pelo amor de Deus, o que estão fazendo com o meu Fluminense!?

Um sujeito sem gravata e paletó, dando um gole no vinho, arriscou uma resposta ao profeta. Mas era melhor que nem a desse…

- Pô, Nelson! Relaxa! Futebol é isso mesmo. Num dia estamos por cima, noutro estamos por baixo.

- Passivos, é isso, vocês são passivos. Onde já se viu? Abandonar o Flu assim à própria sorte. Uma loucura assistir ao time caindo sem que se mova uma palha.

Alguém lembra que o clube vem sendo pessimamente administrado, mas Nelson parecia já ter a resposta na ponta da língua.

- O Fluminense é maior do que a diretoria, é maior do que você, é maior do que eu, é maior do que todos nós juntos… O Fluminense é eterno! Levantem de suas mesas e ajudem-no.

- Como??? - perguntaram todos quase que em uníssono.

- Vamos lotar o Maracanã, colocar o Fluminense no colo, reconduzi-lo ao topo.

E seguiu.

- Varramos o Maracanã com uma tempestade de pó-de-arroz, nossas bandeiras como um estandarte de luz. Gritemos: “Nense, Nense, Nense”. O adversário não vai resistir: tremerá em cima dos sapatos.

Um conselheiro lembra que, ressabiada, a torcida há muito deixou os estádios.

- Nas situações de rotina, um pó-de-arroz pode ficar em casa abanando-se com uma revista qualquer. Mas quando o Fluminense precisa de número, acontece o suave milagre: os tricolores vivos, doentes e mortos aparecem. Os vivos saem de suas casas, os doentes de suas camas e os mortos de suas tumbas. Fluminense x Sport, o jogo da retomada. Quinta, às 21h, da tribuna, estarei acompanhando o início desta grande mudança.

A convocação havia surtido efeito. A torcida estava de novo mobilizada.

Recado entendido, Nelson tratou de ir embora.

- Se quereis saber o futuro do Fluminense, olhai para o seu passado. A história tricolor traduz a predestinação para a glória.

Disse, por último, com sua voz de trovão, antes de escafeder-se.

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