sábado, 11 de março de 2017

7 a 1, 6 a 1, 1 a 1

No dia dos 7 a 1, quando a Alemanha fez o terceiro gol, saí, desnorteado, da casa de uma de minhas filhas, onde assistíamos a Copa em família, e, porque era perto, me refugiei sozinho no apartamento onde vivo com minha mulher, buscando esquecer o mundo, grudado no Netflix. Mas os gritos, lamentos, que vinham dos bares das redondezas não deixavam que a tragédia em progresso me abandonasse.

Como a tragédia dos 7 a 1 não abandona o Tiago Silva.

Escrevo, sem nada querer justificar, mas porque tenho uma imensa admiração pelo futebol dele, e, mais ainda, porque tenho uma imensa solidariedade pela história pessoal dele, não só por ter vindo, como quase todos, dos estratos mais pobres da sociedade brasileira, mas porque quase morreu por abandono em um infecto hospital de Moscou.

Hospital onde o Dínamo da capital russa o largou, sem suporte pessoal algum, para tratar de uma tuberculose que os médicos do Porto, de Portugal, tinha deixado passar batido.

Mais um caso, talvez o mais grave, de tantos jovens brasileiros cujos talentos são desperdiçados na periferia do futebol globalizado. Tiago foi literalmente salvo por Ivo Wortmann. O ex-volante dos bons e passados tempos do América carioca e, depois, do Palmeiras, técnico de futebol, hoje um fora do circuito, em 2005 foi contratado pelo referido Dínamo, e coube a ele, que conhecia Tiago dos tempos em que treinara o Juventude de Caxias do Sul, descobrir o jovem zagueiro no hospital, onde, segundo o próprio Tiago Silva, médicos já se preparavam para lhe abrir o peito e tirar pedaços do seus pulmões. Foi Wortmann quem conseguiu um especialista português para tratar o zagueiro e, quando em 2006,veio treinar o Fluminense, trouxe Tiago com ele (ver, por exemplo, http://globoesporte.globo.com/programas/esporte-espetacular/noticia/2013/06/origens-thiago-silva-abre-o-jogo-e-se-emociona-ao-lembrar-das-dificuldades.html).

E se fez aí um capítulo bonito da história do futebol brasileiro.

Um monstro no Fluminense, foi monstro e capitão do Milan, e é um monstro e capitão do PSG.

Mas, Tiago é também uma das principais vítimas do 7 a 1, ainda que não tenha estado em campo naquele fatídico dia.

A Copa de 2014 passará à história como um dos maiores equívocos esportivos, culturais e políticos da história brasileira. Bilhões foram enterrados em duvidosas 'arenas' país a fora, inclusiva a mais cara e inútil delas, o monstrengo arquitetônico que, aqui em Brasilia, desonra a memória de Mané Garrincha.  Emocionalizou-se a seleção brasileira a um ponto jamais antes visto, envolvida desde a Copa das Confederações com uma profunda crise ético-político do qual o país parece não conseguir sair. Tinha-se a impressão de que o 'hepta' era a poção mágica que nos jogaria de novo para um radiante futuro. Emocionávamos todos, como nunca, com o Hino Nacional que, cantado à capela, desafiava as normas da famigerada FIFA. Os jogadores todos iam às lágrimas, como às lágrimas foi o Tiago quando teria se recusado bater um pênalti na dramática disputa como o Chile nas oitavas de final.

O Monstro, ao mostrar ali toda a sua, ainda que circunstancial, fragilidade emocional, começaria a ver a sua imagem de zagueiro quase que tecnicamente perfeito ser paulatinamente desmontada. Nenhum erro seu jamais voltaria a ser perdoado.

Mesmo quando ele não comete erro algum, e aqui chego à surra que o PSG levou do Barcelona nesta semana. Porque Tiago Silva, e ouvi isso de 'cronista' esportivo brasileiro inclusive,  não fez valer a sua condição de capitão do time, 'sacudindo' o coitado do Marquinhos e outras bilionárias estrelas bancadas por bilionárias quantias bancadas por bilionários árabes.

Durma-se com um barulho desses.

E o tal de Unay Emery?, o 'brilhante' espanhol que ganha bilionário salário pra treinar o PSG? O que dizer da sua 'estratégia' pra segurar o Barcelona no Camp Nou? Não, segundo a imprensa francesa, e até certos jornalistas brasileiros, o grande problema dos 6 a 1 foi o chorão do Tiago Silva.

Por isso, hoje e sempre, por ser o grande atleta que é, por ter sido um dos maiores zagueiros da história do Flu, por ter a história que tem, vai aqui toda a minha, ainda que pouco importante, no contexto de toda essa história, solidariedade ao Tiago Silva.

E o 1 a 1?
Sim, o 1 a 1 do Flu contra o Criciúma.

Depois da maratona da ida e volta a Sinop, depois da belíssima conquista da Taça Guanabara, e depois da inesperada maratona do vôo atrasado para Criciúma, em avião fretado, imaginem, concordo com o Abel: o empate ficou de bom tamanho.


quarta-feira, 8 de março de 2017

Flu Saudades: campeão da Taça Guanabara 1975

Time base:

Félix, Toninho, Silveira, Assis e Marco Antônio; Zé Mário, Cléber e Rivellino; Cafuringa, Manfrini e Mário Sérgio.

Era a Máquina Tricolor surgindo.

segunda-feira, 6 de março de 2017

O Menino da Ceilândia

Em 2012, quando subiu das categorias de base para a equipe principal do Fluminense, o menino Marcos Júnior, depois de fazer o quarto gol na decisão do Carioca daquele ano - vitória de 4 a 1 sobre o Botafogo -, na entrevista de final de jogo, entusiasmado, falou ao repórter, e eu parafraseio:

- O professor - que só poderia ter sido mesmo o Abelão - me disse pra entrar e resolver; eu fui lá e resolvi.

Foi o que bastou para Deco, então o mais vencedor daquele elenco do Fluminense, que tinha Fred e Tiago Neves, entre outros, e que terminaria o ano como campeão brasileiro, arrumasse logo um apelido para o atrevido e elétrico novato:

- Resolve.

Em 2011, na final do Torneio Otávio Pinto Guimarães, competição carioca de juniores, da qual ele foi o artilheiro com 9 gols, depois de um empate com o Flamengo por 3 a 3, que deu o título ao rubronegro, Marcos Júnior chorou copiosamente, pela derrota, é claro, porém, mais que tudo, porque seu pai, Antônio Marcos, por  falta de condições financeiras, não pudera viajar de Brasília para assistir o jogo (http://globoesporte.globo.com/futebol/times/fluminense/noticia/2011/11/atacante-da-base-do-flu-chora-pela-ausencia-do-pai-na-final-do-opg.html).

Marcos Júnior é filho da Ceilândia, a cidade-satélite, na verdade um dos grandes bairros periféricos de Brasília, com seus cerca de 400 mil moradores, que tem esse nome porque nasceu de um projeto socialmente cruel, logo após a fundação da nova capital, com o nome de Campanha para Erradicação das Invasões, daí o a acrônimo CEI, daí o nome Ceilândia. Considerado o mais nordestino dos bairros brasilienses, abrigo daqueles trabalhadores que ajudaram a erguer a nova cidade, que nela moravam em acampamentos precários, mas no Plano Piloto, e que dela foram afastados para as franjas precárias da capital do país.

Foi na Ceilândia que Marcos Júnior deu seus primeiros chutes em uma bola de futebol, e é na Ceilândia que ele mantém um projeto social, uma escolinha de futebol, fazendo o que muitos atletas como ele fazem - dar retorno social às comunidades pobres de onde vieram, e de onde saíram graças ao esporte.

Mas, e voltando ao Deco e ao apelido - do qual ele hoje já se livrou: Marcos Júnior resolve?

Sim, se não vejamos: de seus pés saíram os gols dos últimos título do Flu: o da Primeira Liga, ano passado, e o da Taça Guanabara, ontem.

Nossas homenagens candangas, pois, ao Menino da Ceilândia.

De resto, muita vontade de falar mais sobre o jogo de ontem.

Mas, por ora, apenas um registro emocionado.

Afinal, como não se emocionar diante da emoção de Abel Braga, um dos mais  vitoriosos, e veteranos, treinadores do nosso futebol, às lágrimas, ontem, depois de o Fluminense, em jogo épico - digno de um Nélson Rodrigues - vencer nos pênaltis a Taça Guanabara. Sim, a Taça Guanabara! Um primeiro turno de um, por vezes, molambento campeonato carioca, que só garante vaga na semifinal. Se o choro do Abel não reflete um baita amor pelo Fluzão, o que mais refletiria?